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choro silencioso

Atualizado: 17 de ago. de 2023

eu falo “oi” e já me perguntam de onde vem o meu sotaque. no começo, era justamente o que me incomodava.

o não saber falar perfeitamente, o erro, a pronúncia…

me travava.

o que eu mais queria era falar, aprender.

e era justamente o que eu menos fazia.

imagino que muitos dos meus choros quando criança vieram desse mesmo sentimento.

essa impotência dentro dessa grande possibilidade.

esse enorme desejo dentro dessa minúscula experiência.


mas tudo mudou quando eu percebi que isso,

que me fazia odiar abrir a boca,

era exatamente o que mais fazia com que as pessoas desejassem que eu o fizesse.

comecei a entender a beleza em ser diferente.

o soar, o se vestir, o se portar diferente.


e assim, com essa aura de sotaque,

aprendi a ter orgulho de onde venho.

da minha trajetória.

aprendi a lidar com as risadas dos poucos que não se esforçavam para me entender.

feliz por mim mesma, por ter ido para muito além desse julgamento.

do ponto de vista de quem ria,

alguém que não sabia falar.

do meu ponto de vista de quem tentava,

alguém que arriscou viajar para a outra ponta do globo,

com a vida na mala, o coração na mão e os amores na memória, para ousar aprender.

alguém que passou por muito,

inclusive por aqueles mesmo choros que tantas vezes devem ter angustiado meus pais.

mas, dessa vez, sozinha.

o choro veio - e quantas vezes ainda vem e virá.

mas, dessa vez, sem ninguém para tentar fazê-lo parar, compensar.

então decidi ao outro lado dessa infância silenciosa me conectar:

à escuta. à observação. ao riso. à diversão.

me divirto com meus erros,

rio das minhas tentativas, das minhas gafes,

me orgulho sempre que aprendo algo novo ou escuto de alguém que melhorei.

encho o peito e falo entre um sorriso:

— vim do Brasil.

o que normalmente acontece logo em seguida do mesmo “oi”.

e, percebi, normalmente recebo

outro sorriso de volta.


como toda (o) brasileira (o) tenho diversas ressalvas

para falar desse lugar que chamamos de pátria.

mas uma coisa eu não posso negar:

sempre inspiramos esse espelho sorridente.

a nossa energia, simpatia, sensualidade.

essa alma da união, da celebração,

da abundância, do calor, do futebol, da música, da dança…

alegram quem quer que seja.

mesmo aqueles que, primeiro, riram ironicamente do meu sotaque.

hoje em dia eles ainda riem,

mas sinto que mais de orgulho,

ao saber que uma brasileira conhecem.


e eu amo falar de onde vim.

e, ainda melhor, hoje em dia amo simplesmente falar.

e só - mas, ao mesmo tempo, e isso tudo.


parei de ter vergonha do meu sotaque.

pelo contrário, tenho orgulho das minhas raízes.

sim, não sei e nem nunca vou falar como eles.

mas isso diz muito sobre mim.

sobre o que percorri para estar aqui.

e, ainda sim, seguir tentando.



Nouméa, Nouvelle-Calédonie __ Agosto, 2023.

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© 2019 por Isabela Carvalho

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